A Costureira

de Nuno Gonçalves

 

— Sãozinha, que maravilha! Assentam-me como… uma luva! — Dona Idália riu-se da sua própria piada, sem parar de admirar as novas luvas.

— Não lhe estão um pouco largas aqui? — perguntou Sãozinha, de cenho franzido.

— Deixe estar, mulher! Estão perfeitas! E este couro… tão resistente e macio. Complementa tão bem o meu tom de pele.

— O bom material é metade do trabalho — replicou Sãozinha, com aquela voz que indica ter chegado a altura de pagar.

— Já ouviu do Seixas? — perguntou Dona idália, puxando da carteira. — Faz uma semana que desapareceu. Não que se tenha pena. Foram muitos bons antes dele.

Sem dar espaço para mais coscuvilhice, Sãozinha encaminhou Dona Idália para a rua. Trancou a porta e desceu à cave. Tinha ainda muito que fazer. Os homens mais teimosos são sempre os mais trabalhosos.

 

 

 

 

SOBRE O AUTOR

Nuno Gonçalves

Nuno Gonçalves devora livros há 30 anos. O prazer da leitura fez crescer a vontade de um dia ver as suas próprias palavras no papel, encadernadas, à espera de um leitor. O caminho escolhido foi outro, e a Medicina atraiu-o mais do que as Letras. Manteve a ligação à literatura, retomando os hábitos de leitura e dinamizando um blogue de crítica literária durante alguns anos. Depois de iniciar uma nova caminhada na escrita de ficção, venceu o prémio António de Macedo em 2022 e foi o finalista português do concurso de microcontos da EACWP em duas ocasiões (2022 e 2023).