Aeternum Vale

de Susana Silva

 

 

Ecos tímidos na madeira.

Sussurrantes,

Pétalas esvoaçantes,

Intocadas.

Terra afogada,

Em golfadas ocas

Numa melodia

A três tempos.

 

Não uma tumba grandiosa,

Mas uma cova no chão.

 

O meu olhar viaja,

Espreitando linhas esculpidas,

De bichos e tempo,

Minúsculos grãos de areia,

Tantos; oceanos de chão

Que outrora pisei.

Gotas ínfimas

Mergulham nos meus

Olhos,

Sal,

A noite,

Escuridão.

 

Regresso ao fundo.

E aguardo.

O Tempo passa.

 

Fontes de lágrimas lavadas

Brotam em torno

De mim, e todas as Tuas

Criaturas

Corroem…

As minhas células,

Os meus átomos,

O meu ser.

 

O Tempo passa.

 

O metal depura

O meu caixão, no fim.

Mãos trémulas carregando

Uma carcaça vazia

Em longos farrapos bordados.

 

No salão nobre,

A minha tumba condigna,

O meu sólio.

 

Beladonas inebriantes

Permanecem aos meus pés,

Suspensas.

Flores e putrefacção.

 

Sobes os três degraus até mim.

Seguras na minha mão nua,

Carne pura esvanecida.

Agarro um sorriso dos Teus lábios.

E nos meus cabelos

Jaz ouro cravado a fogo,

O Teu coração de cinco pontas,

Meu Rei,

Meu Pedro.

 

*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945

 

SOBRE A AUTORA

Susana Silva

Susana Silva, também conhecida como Susie Saint-Claire, nasceu em Lisboa, mas foi Évora a cidade que a viu crescer. É oceanógrafa física, mas desde cedo que a escrita mora na sua gaveta. Em 2021, o seu conto de estreia, «O Palco Vazio», integrou a antologia de contos de terror Sangue Novo. Para Susie, a escrita é uma forma de expressão sensorial, que usa para pintar imagens aprisionadas na sua mente. Mergulhar na sua prosa poética é descer a um mundo de escuridão, melancolia e tempo…