Exofinados

de Helena Menezes

 

No exoplaneta Amalteia-b, também se festejavam os mortos. Político sem cabeça, mestre de obras sem mãos e padre proxeneta eram as fantasias mais cobiçadas. Modas vindas da Terra, descontextualizadas. A procura de humanos aumentava nesta altura. Embalsamados, em pacotes individuais ou sacos promocionais com famílias inteiras, ou vivos, se as reservas intergeracionais dos laboratórios de produção permitissem. 

As festividades começavam na primeira noite das três exoluas cheias. Glorificava-se ali os homo sapiens sapiens quase extintos, com banquetes de corpos anafados em espetos, assados em fogueiras arcaicas de fogo vivo, num revivalismo puro da ancestralidade terráquea. Como decorações, os indivíduos mais descarnados. Mortos-vivos enrolados em luzes coloridas num ambiente mais festivo e humano. 

O fim do louvor aos mortos era marcado pelo enterrar cerimonial dos restos e enfeites que amalteia havia de comer. Uma oferenda simbólica daquela exoterra ao longínquo e cinzento planeta Terra, padroeiro intergaláctico dos mortos. 


SOBRE A AUTORA

Helena Menezes

Nasceu em Lisboa em 1981. Licenciou-se, tirou mestrado e trabalhou como bolseira de investigação, na área das Ciências da Paisagem, entre 2007 e 2013, na Universidade de Évora. Paralelamente à escrita científica, foi fazendo incursões na escrita criativa. Arjuna e o Espírito do Tigre (conto infantojuvenil, Ed. Primeiro Capítulo) foi o primeiro livro, publicado no final de 2022. Participou na coletânea 13 Autoras em Vénus (poesia erótica, Ed. Vieira da Silva) lançada em abril de 2023. Iniciou-se na escrita do terror, algo despoletado pela masterclass do Pedro Lucas Martins, visualizada recentemente na formação «Livro em Ação».