Tréguas
de Liliana Duarte Pereira
Quem me dera dançar livre como dançam as cores nas ruas escuras. O que ninguém sabe ninguém sente a necessidade de catalogar. A sombra da ignorância sussurra quando o Sol nasce. Na claridade, não se contam histórias de metamorfose. Dizem-nos que somos o que espelho reflecte. Ignoram que o corpo é apenas uma casca provisória, que acolhe almas sem-abrigo. As flores não nascem só nos campos verdes, brotam das nesgas que unem as pedras. A rigidez da normalidade espezinha a diferença. Procuram em nós um erro que a justifique, impedindo-nos de ser. Tréguas pelos que sobreviverem. Para mim, chegarão tarde.
*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945
SOBRE A AUTORA
Liliana Duarte Pereira
Liliana Duarte Pereira, nascida a 30 de junho de 1986, é licenciada em Política Social através do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Sempre quis preparar os mortos para os seus funerais, mas não vingou. Tem fobia a pessoas falecidas e a portas entreabertas. Gosta de animais, de fazer doces, de rir de coisas mórbidas e de escrever.
Integrou as antologias Sangue Novo (2021), Rua Bruxedo (2022) e Sangue (2022).
Venceu o Prémio Adamastor de Ficção Fantástica em Conto (2022) com «O Manicómio das Mães», da antologia Sangue Novo.