Túneis

de Ana Rita Garcia

 

Pensava conhecer os túneis como a palma da mão. Sabia por onde entrar e por onde sair, porém, ao perder a luz, perdeu o norte. Esbugalhou os olhos, como se isso lhe permitisse reencontrar o caminho.

Esticou o braço, tentando alcançar a parede e a confiança. Arrepiou-se ao sentir os dedos enterrarem-se na humidade quente do que a rodeava. Deixara de sentir o cheiro pestilento dos túneis. Habituara-se. Temia ter sido engolida por ele.

Deu mais dois passos e tropeçou em algo. Arfou ansiosa. O seu temor ecoou nas profundezas, paralisando-a.

— Olá? — chamou, como quem pede ajuda.

— Demoraste — respondeu-lhe a escuridão.

 

 

*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945

 

SOBRE A AUTORA

Ana Rita Garcia

Sonhadora incurável, adepta de cafés longos e de passeios à beira-mar, nasceu em Lisboa, em outubro de 1988. Cresceu a usar o lápis para se expressar através de formas e palavras. Formou-se em Arquitetura, escondendo a paixão pelas Letras até as histórias começarem a escorrer-lhe pelos dedos. Integrou as antologias In/Sanidade e Dúzia (Editorial Divergência), publicou o conto «Colecionadora» no sexto número da revista literária Palavrar e tem vários contos publicados na página oficial da Fábrica do Terror. Em 2024, foi vencedora do Prémio Ataegina para Conto Original, com Os Acasos Improváveis de Mister Rayleigh.