Crítica a «Casa De Sant’Anna», de JP Félix da Costa

Na sua dedicatória à Fábrica, o autor diz-nos que escreveu uma história «que não é de terror… mas é», e nada resume melhor a sua obra.

Tendo origem num singelo conto, o autor leva-nos a descobrir a história trágica da família De Sant’Anna, cujas conexões são mais complexas do que aparentam.

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Laura Silva

Casa de Sant’Anna poderá gerar uma ligeira controvérsia quanto ao facto de ser ou não terror. De facto, o autor não se debruça de forma intensa no género, e os elementos existentes facilmente passarão despercebidos a leitores menos atentos, pelo que acredito que alguns possam torcer o nariz à sua inclusão aqui na Fábrica.

Mas, como diz a minha avó, quem nasce torto tarde ou nunca se endireita, e «torta» é precisamente o adjetivo que ela mais usa para me descrever. Quer isto dizer, portanto, que não só entendo ser correto definir esta obra como pertencendo ao género do terror, como defendo veementemente que é uma excelente introdução ao mesmo, especialmente para pessoas que sejam muito sensíveis ou assustadiças.

Em Casa de Sant’Anna, o autor começa por nos contar a história de Teodora, que acabou de falecer. A sua morte acaba por servir de mote ao desenvolvimento da história, mas também por ser um momento de particular importância para aquela família.
Após este início, Félix da Costa consegue mostrar-nos diversas gerações da família De Sant’Anna, criando ligações inteligentes entre os seus diversos elementos e adicionando bastantes easter eggs para cada personagem. Acaba por se tornar um puzzle que vamos tentando desvendar à medida que lemos, tudo com a intenção de descobrir quem é responsável por X ou Y.


O terror, que, como referi acima, é relativamente leve e uma boa introdução para novatos, transmite-se não só na componente humana, mas também através de elementos paranormais que surgem muitas vezes como uma tentativa de corrigir o destino. Atrevo-me mesmo a dizer que o paranormal até é, no final de contas, mais reconfortante do que a componente humana!


O autor também conseguiu dar vozes distintas às suas personagens, adequando-as à época, mas também às suas próprias experiências. Uma personagem em particular, de narrativa extremamente machista, deixou-me com vontade de bater em alguém, mas a exploração de perspetivas por parte de Félix da Costa é de louvar.

A obra é curta, pelo que a sua leitura facilmente se completa num dia, mas nem por isso deixa de ser bastante apetitosa, especialmente considerando que o autor consegue, de forma simples e humilde, conectar o leitor a cada personagem que nos apresenta com bastante facilidade.

Não posso dizer que seja o livro mais surpreendente que já li (e, nesse sentido, a sua diminuta dimensão joga a seu favor, porque, quanto mais extenso fosse, mais se perderia do elemento surpresa), mas é uma obra sólida, bem escrita e cativante — que adoraria ver adaptada ao cinema.

Trigger warning: violência doméstica descrita na página.

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Laura Silva

Apaixonada por histórias desde 1992, é escritora nas horas vagas e pasteleira aos fins-de-semana. O gosto pela leitura deu muito jeito para a licenciatura em Direito, mas agora é constantemente abordada por amigos e familiares para consultoria jurídica gratuita. Extremamente traumatizada em criança pelo Cadeirudo, acabou por aprender a gostar de todas as facetas da ficção especulativa, que hoje se revela o seu género favorito.

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