As Voltas Que a Morte Dá
de Maria João Amaral Graça
Acordei com o corpo embebido num suor gelado. Doía-me a cabeça e sentia as pálpebras pesadas, doloridas. Abro os olhos a conta-gotas, estranhando não ver nada à frente a não ser uma escuridão silenciosa, com cheiro a flores e a terra molhada, diferente do habitual odor a éter dos corredores hospitalares. De repente, ouço o som de vozes abafadas, ao longe.
— Vou ter saudades do teu sorriso — disse uma delas, a soluçar.
— Ela nunca devia ter conduzido naquele temporal. — Parecia a voz da minha mãe.
Sinto o oxigénio a dissipar-se a cada volta presa do meu corpo. O coração bate acelerado e a boca, aberta, procura algo que mantenha o cérebro a funcionar. As unhas tentam rasgar a superfície acima, num ato desesperado, quando as batidas violentas não produzem efeito. Grito, esperneio e, por fim, choro de resignação, lamentando a hora em que deixaram de colocar sinos nos túmulos.
SOBRE A AUTORA
Maria João Amaral Graça
Maria João Amaral Graça nasceu a 21 de junho de 1976, em Lisboa, onde vive atualmente.
Desde pequena que gosta de contar histórias, sejam elas para miúdos ou graúdos. Colaborou na coletânea Que Não se Calem as Mãos, com o conto «Barriga Milionária», no decorrer de um curso de escrita criativa. Neste momento, é membro do Clube dos Writers, com a mentora Analita Alves dos Santos.