Buraco Negro
de Inês Garcia Morais
Acordou de repente, com o som díptero das luzes fluorescentes a penetrar-lhe o crânio. Os seus pequenos pulsos em retalhos remediados estavam pousados grosseiramente sobre a superfície fria, o frio demorando apenas um segundo a abraçá-la. Isso deu-lhe a certeza de não ter morrido ainda, apesar de permanecer imóvel. Tentou mexer a cabeça, com dificuldade. Quanto tempo teria passado?
Sussurros ao longe. Seriam reais? Não via ninguém. Pareciam troçar das suas débeis tentativas de se libertar. Engoliu em seco, a saliva era quase inexistente. Precisava urgentemente de água.
Ouviu passos. Uma estrela apagou-se.
Ainda assim, viu um sorriso. O rosto, o perfume, as mãos como tarântulas na porta, os símbolos do seu cativeiro. A certeza de que não teria forças para escapar, mesmo de porta aberta, envenenava-a com vergonha. Talvez fosse culpa dela. E eles sabiam.
«Até amanhã, Joana.»
*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945
SOBRE A AUTORA
Inês Garcia Morais
Gryffindor nascida a agosto de 1986.
Licenciada em Estudos Anglo-Americanos (2009), com pós-graduações em Tradução e Arte e Educação. Fascinada por Poe e Gaiman; Burton, Spielberg e Aronofsky; cidadã de Gotham, Hogsmeade e Rivendell; fã de Zimmer e música dos anos 90.
Com dez anos de experiência em ensino, trabalha agora em integração e well-being.
Foi escrevendo sobre filmes e séries, e completando diversas formações
em Escrita Criativa.
Hoje, o seu propósito passa por explorar e partilhar a terapia existente nas histórias que amamos.
Acima de tudo, acredita que transformar emoções em vida contada é a mais bela das homenagens.