Proporção
de Liliana Duarte Pereira
Uma chávena de arroz para duas chávenas de água. A medida certa, pelo menos para o arroz. A canja pede refogado, carne bem desfiada e água, muita água. Mais do que a suficiente para cobrir o preparado, porque a gordura precisa de espaço para boiar. O segredo é juntar as patas do bicho, bem limpas e cozidas com um toque fresco de hortelã. São elas que dão o sabor. Como a estética não as torna apelativas, são retiradas antes de servir. Mais tarde, quando ninguém estiver a ver, o cozinheiro poderá banquetear-se. As cartilagens fibrosas desafiam a estabilidade dos dentes, e os ossos conferem uma crocância única, bem como os restos de verniz que ainda brilham nas unhas.
*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945
SOBRE A AUTORA
Liliana Duarte Pereira
Liliana Duarte Pereira, nascida a 30 de junho de 1986, é licenciada em Política Social através do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Sempre quis preparar os mortos para os seus funerais, mas não vingou. Tem fobia a pessoas falecidas e a portas entreabertas. Gosta de animais, de fazer doces, de rir de coisas mórbidas e de escrever.
Integrou as antologias Sangue Novo (2021), Rua Bruxedo (2022) e Sangue (2022).
Venceu o Prémio Adamastor de Ficção Fantástica em Conto (2022) com «O Manicómio das Mães», da antologia Sangue Novo.







