Sacrifício
de Sónia Pedroso
Marco subia a encosta com dificuldade, a segurar o capuz da gabardina com as duas mãos, enquanto o vento insistia em destapar-lhe os cabelos.
Quando chegou ao cimo, o céu estava cor de chumbo. Via-se uma cortina de água poderosa. Da serra, escorriam rios até à aldeia.
Fechou as janelas e preparou-se para tirar as velas do moinho. Ao retirar o nó da corda, porém uma rajada de vento puxou a roda que lhe prendeu o capuz. Sentiu os pés a elevarem-se. Viu-se incapaz de se libertar.
Gritou por ajuda, mas o vento devorou-lhe a voz. A roda desceu, a fita da gabardina enrolou-se também. Não conseguia aliviar a pressão no pescoço. Desesperado, Marco tentou despir a gabardina. Lembrou-se ainda de travar com as pernas ao roçar o chão. Mas nada conseguia parar o movimento infernal da roda.
Há muito que Éolo não tinha em sacrifício em seu nome. Hoje, decidiu que era tempo de receber um.
*Este texto foi redigido segundo o Acordo Ortográfico de 1945
SOBRE A AUTORA
Sónia Pedroso
Sónia Pedroso nasceu em setembro de 1976 e vive com os dois filhos adolescentes. Saloia da Malveira, fez a escolaridade obrigatória no concelho de Mafra. Depois da não entrada na Faculdade de Letras de Lisboa, tirou um curso profissional e foi trabalhar. Atualmente, trabalha como técnica de contabilidade numa empresa de transportes.
Adepta de atividade física, pratica strong e muay thai para sanidade mental.
Leitora compulsiva desde nova, começou a escrever incentivada por um amigo e, desde então, não parou. Para melhorar esta arte, tem feito workshops, formações e clubes de leitura, porque não é de desistir facilmente.