Crítica à antologia «Devil’s Rejects» (2022)
Editada por Michael R. Goodwin, o livro inclui um conto do autor português Miguel Gonçalves
Já é raro encontrar histórias assumidamente de terror escritas por portugueses. Ainda mais raro é encontrá-las em antologias estrangeiras. Assim, esta antologia mereceu o interesse da Fábrica do Terror.
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16.50 € (com IVA)A nota introdutória do editor de Devil’s Rejects (2022), Michael R. Goodwin, contextualiza o leitor acerca do propósito desta antologia: dar uma segunda oportunidade a obras previamente rejeitadas. Assim, Devil’s Rejects congrega 12 contos de terror, um deles, «The Scarecrow Man», de um escritor português: Miguel Gonçalves.
Já é raro encontrar histórias assumidamente de terror escritas por portugueses. Ainda mais raro é encontrá-las em antologias estrangeiras. Assim, esta antologia mereceu o interesse da Fábrica do Terror, mas não só por este facto; há bom terror nestas histórias, que merecidamente foram acolhidas numa segunda casa.
O terror é o elo unificador destes contos. Histórias que vão desde maldições hereditárias a assassinatos sanguinários, de sacrifícios a mutações monstruosas. Alguns contos inovam na forma como tecem a narrativa, servindo-se da técnica do found footage, no caso de «The Cursed», de Spencer Hamilton, e de fragmentos de cartas e jornais, no caso de «Yours Truly», de Marcus Hawke.
Além disso, muitos dos autores e das personagens destes contos pertencem a grupos historicamente negligenciados, como mulheres e pessoas LGBTQIA+. Isto é importante, pois, deste modo, a antologia pode ser uma fonte de esperança para leitores desejosos de se verem representados enquanto personagens e criadores deste género. Como argumenta R. Shanea Williams, «se não te vês regularmente representado nalguma coisa, é difícil veres-te como criador dessa mesma coisa» (no original, «If you don’t see yourself often represented in something, it’s hard to see yourself as a creator of that very thing»).
Há um pouco de tudo nesta antologia, que por certo agradará a qualquer amante do género.
«The Scarecrow Man» é o terceiro conto da coletânea. Tem uma premissa original, acerca de um homem que cria espantalhos. O conto alterna entre relatos do presente e do passado, oferecendo, paulatinamente, peças ao leitor para que este construa o puzzle da narrativa. O elemento macabro caminha entre as linhas, velado, mas presente, de uma forma deliciosamente inquietante. Miguel Gonçalves apresenta personagens interessantes e um protagonista misterioso, que nos faz desejar descobrir as origens da sua estranha ocupação e o final perturbador que certamente nos aguarda.
E não desilude.
Recomenda-se Devil’s Rejects a qualquer aficionado de terror e, especialmente, «The Scarecrow Man», que prova que existe, sim, bom terror português e que esse terror tem um espaço no público internacional.
Após uma rejeição, podem surgir sentimentos de desânimo e inadequação. Esta antologia pode trazer um novo alento a qualquer escritor que esteja a passar por uma fase semelhante. Não desistir é fulcral para encontrar a casa certa.
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Patrícia Sá
Patrícia Sá nasceu em 1999. Desde muito cedo que encontrou um refúgio na escrita e estreou-se como autora em 2021, com o conto «Amor», na antologia «Sangue Novo». Interessa-se especialmente pelo estudo da monstruosidade na literatura, nas artes e na cultura. Está determinada a provar que o terror é um género sólido. A arma dela? Resmas de livros teóricos sobre o assunto. Sublinhados. E com «post-its».