Locais a visitar: Museu Arqueológico do Carmo (Lisboa)
É nas ruínas da antiga igreja do Convento de Santa Maria do Carmo (mandado construir em 1389 por Nuno Álvares Pereira, o Santo Condestável) que se encontra instalado o Museu Arqueológico do Carmo, considerado o primeiro Museu Português de Arte e Arqueologia.
Foi fundado no ano de 1864 pela Associação dos Arqueólogos Portugueses e é um monumento de grande beleza, com um espólio que vale a pena conhecer.
De Liliana Duarte Pereira
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Não, não está assombrado. Pelo menos, que se saiba. A verdade é que, com o entra e sai de visitantes, quem é que consegue distinguir os vivos dos mortos?
Com ou sem almas do outro mundo, não deixa de ser um local capaz de nos provocar calafrios, não estivessem em exposição duas múmias pré-colombianas (séc. XV aproximadamente), de uma mulher e de um rapaz com cerca de 12 anos. Foram removidas de um cemitério Chancay, próximo da praia Ancón, e estão ambas em posição fetal, algo muito comum nos enterros destas culturas.
Não são agradáveis à vista, mas o que provoca desassossego é pensar no facto de o seu descanso ter sido interrompido pela permanentemente exposição. É difícil observá-las, sobretudo, quando algo nos diz que se vão mexer a qualquer momento. Confirmo que se mantiveram impávidas e serenas enquanto ali estive. Não estou certa do que poderá ter ocorrido depois de virar costas.
No chão da primeira sala, existe uma tampa em vidro que passa despercebida à maioria dos visitantes, intrigados quando me baixei para ler a placa dourada onde se lê «Jazigo da família Cabral. Século XVII (?)». É um forte indício de que andamos por ali, para trás e para frente, enquanto, debaixo dos nossos pés, estão instaladas ossadas de uma família inteira.
Em exposição, estão também alguns túmulos, nomeadamente o túmulo do rei D. Fernando I de Portugal e da rainha Maria Ana de Áustria. Faço-lhes referência, tendo em consideração o seu pós-morte agitado. Em termos de tamanho, cada um dos túmulos representa para lá de uma assoalhada. Escusam de ir com ideias de espreitar ou de tentar mover as tampas. Primeiro, porque, por razões óbvias, não é permitido; segundo, porque o peso exigiria intervenção divina, ou pelo menos de uma grua; terceiro, porque estão em ausência de recheio.
Como resultado das invasões francesas, e mais tarde com a extinção das ordens religiosas, o túmulo do rei D. Fernando I de Portugal, que se encontrava primeiramente no Convento de São Francisco, em Santarém, foi vandalizado, e até hoje nada se sabe sobre o paradeiro dos seus restos mortais. O coração da rainha Maria Ana de Áustria foi enviado para a Cripta Imperial em Viena, e o seu corpo foi enviado para o Mosteiro de São João Nepomuceno, dos Carmelitas Descalços Alemães, sendo depois transladado para um novo mausoléu. Encontra-se atualmente no Panteão da Dinastia de Bragança.
Neste museu, encontrará, entre outras coisas, o belo sarcófago das musas, lápides sepulcrais, esculturas de santos, painéis de azulejo, estelas de sepulturas e um sarcófago egípcio de madeira, danificado na zona inferior, permitindo que pessoas com instintos mórbidos mais apurados analisem os pés da múmia que nele reside.
Não nos podemos esquecer de que este edifício estará para sempre associado ao Terramoto de 1755 e à conhecida expressão «cair o Carmo e a Trindade». A sua reconstrução nunca foi concluída e a verdade é que as ruínas lhe conferem um ambiente único.
Por fim, e só para causar incómodo, diz-se que no início do século XIX, a nave central terá servido como cemitério… Agora, pensem o que quiserem.
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Liliana Duarte Pereira
Liliana Duarte Pereira, nascida a 30 de junho de 1986, é licenciada em Política Social através do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Sempre quis preparar os mortos para os seus funerais, mas não vingou. Tem fobia a pessoas falecidas e a portas entreabertas. Gosta de animais, de fazer doces, de rir de coisas mórbidas e de escrever.
Integrou as antologias «Sangue Novo» (2021), «Rua Bruxedo» (2022) e «Sangue» (2022). Venceu o Prémio Adamastor de Ficção Fantástica em Conto (2022) com «O Manicómio das Mães», da antologia «Sangue Novo».