Os Dois Terrores
de Nelsenstein
Texas Coli era um pequeno hotel com uma classificação de duas estrelas e meia, perto de uma pequena cidade chamada Nailstone. Atrás dele, havia uma floresta.
— ‘Tás a falar a sério? — perguntou Jessica.
— Bem… já é qualquer coisa, certo? — disse Christie.
— Qualquer coisa para sair daquela cidadezinha — acrescentou Mia.
Rhonda abraçou as amigas por trás.
— Não podia concordar mais!
***
A noite chegou. Estavam a jogar verdade ou consequência no quarto e era a vez de Christie.
— Então, verdade ou consequência? — perguntou Jessica.
— Verdade! — respondeu Christie.
— Tu… gostas de alguém?
Christie corou.
— É o Michael? — indagou Jessica com um sorriso malicioso.
— S-Sim… — Christie cobriu o rosto com as mãos.
— Agora é a tua vez, Mia! Verdade ou consequência! — desafiou Rhonda.
— Eh… consequência! Escolho consequência! — respondeu Mia, tentando tirar o foco de Christie.
— Eu desafio-te… a ires ver onde vai dar aquele caminho na floresta! — disse Christie apressadamente.
— Sim, miúda, assim é que é!!! — disse Jessica com entusiasmo.
— Mas tipo… agora?
— Sim, agora. — Christie sorriu-lhe.
— OK… Mas vocês vêm comigo.
Jessica e Rhonda quase responderam ao mesmo tempo.
— Claro!
As raparigas começaram a vestir-se e rapidamente estavam lá fora, frente à floresta.
— Isto é meio assustador — disse Christie, ao começarem a andar por entre as árvores.
— A ideia foi tua — disse Mia.
— Eu sei, eu sei…
Caminharam por algum tempo, ao longo do caminho iluminado pela Lua, até que Jessica, que assumira a liderança num novo desafio, parou.
— O que é aquilo ali?
— Parece um portão — disse Rhonda.
Jessica continuou em frente.
— Jessie, espera.
Mia foi atrás dela. Christie e Rhonda não disseram nada, mas também as seguiram, em passo rápido.
O portão torto tinha os números 836 na lateral, embora não houvesse outras casas à vista. Uma das barras de ferro estava em falta.
— Christie, verdade ou consequência? — disse Mia sarcasticamente.
— Consequência…? — Conseguia ouvir-se a incerteza na voz de Christie.
— Desafio-te a ires bater àquela porta. — Mia apontou para uma casa velha para lá do portão.
Christie olhou para a casa aparentemente abandonada e suspirou. Encheu-se então de coragem e passou pela abertura, com as outras a seguirem-na, logo atrás. Não conseguiam parar de rir. Assim que entraram, Mia e Jessica começaram a incentivá-la.
— Vai lá, vai bater à porta.
— Já vou. Dá-me um segundo.
— Vá, não te acobardes agora — disse Rhonda.
Christie demorou um momento, enquanto olhava outra vez para aquela casa escura e decrépita, mas finalmente pôs-se a caminho.
Chegando à porta, hesitou antes de bater. Estava pronta para voltar-se e correr assim que o fizesse. Mas não houve tempo. Subitamente, houve um som alto. Antes que o percebessem, a porta tinha um buraco, e Christie tinha sido empalada pelo estômago, o sangue escorrendo-lhe pela boca, a borbulhar.
— Merda — disse Christie, antes de ficar inconsciente.
— Christie!!!
Chocadas, as outras raparigas não chegaram a ver que havia uma sombra rastejante, a aproximar-se por trás delas.
***
— Mia, acorda! ACORDA!
Mia acordou com o som de Jessica a gritar.
— Não te atrevas a tocar-lhe, sua aberração!
Estavam amarradas a uma cadeira numa sala cheia de correntes e ganchos. Havia um cheiro a carne crua. Na parede salpicada de vermelho, estava um único quadro: um casal de tom cadavérico abraçado a duas crianças de pele semelhante.
— HAHAHA, já viram isto? — Um homem estranho e pálido, com cabelos escuros e um capuz ensanguentado, estava de pé ao lado de uma mesa onde se estendia uma Christie quase inconsciente. Segurava um machado. — Sou o Jeff, the Killer! Estão a ver? Porque sou o Jeffery e vou matar-vos.
O seu sorriso era doentio.
— Um, dois, três!!! — O homem balançou o machado e enterrou-o na garganta de Christie, decapitando-a quase na totalidade. O assassino fez o machado torcer na coluna cervical, com um estalar terrível.
— NÃO!!! CHRISTIE!!!!!! — gritou Jessica. Mas Christie já não a conseguia ouvir.
Jeffery começou a rir loucamente.
— Agora só preciso de a prender como a ovelha que ela é e pô-la ao lado da vossa outra boa amiga!
Mia olhou para a esquerda e gritou! Ali estava Rhonda, morta, de olhos bem abertos e sem vida, com sangue a escorrer-lhe pelo corpo.
Jeffery puxou um dos ganchos de metal, preso a uma corrente, e agarrou o cadáver de Christie pelo pé direito. O gancho atravessou a carne morta e o osso. Não facilmente. Mas não era claramente a primeira vez que ele o fazia. O pé esquerdo foi o próximo.
Jeffery puxou então a corrente e o corpo sem cabeça de Christie foi içado, deixando um rasto de sangue pela mesa e pelo chão.
A mente de Jessica não aguentou mais, e ela desmaiou, enquanto Mia permanecia consciente, mas em lágrimas. Viu Jeffery a marcar um mapa de carne no corpo de Christie, como os que se veem no desenho de uma vaca, nos talhos. .
De repente, um grito estridente veio da outra sala:
— Irmãoooooo! Como vai o jantar?
Um homem com dois metros de altura e igualmente pálido, com olhos fundos e dentes tortos e sanguinosos, entrou pela porta. Tinha um cachecol rasgado e uma camisa manchada de sangue. Segurava também uma chávena de chá.
— Oh! Como estão as nossas convidadas? Uma delas parece pronta!
O homem alto olhou então para Mia.
— Irmão! Quem é esta bela donzela que aqui vejo?
— Porque é que não lhes perguntas, mano?
Num ápice, a figura alta e torta colocou-se frente ao rosto de Mia.
— Olá, menina…
— Mia… O meu nome é Mia.
— Menina Mia, é um prazer conhecê-la! O meu nome é Theodore Pamplehouse, e aquele ali é meu irmão, Jeffery Pamplehouse.
— Com’é que é? — disse Jeffery.
— Posso oferecer-lhe uma chávena de chá? — perguntou Theodore, colocando a chávena à frente de Mia.
Ela virou a cara em repulsa, adivinhando corretamente por que razão o chá era de um vermelho brilhante.
— Não é fã de chá de sangue, estou a ver. De qualquer modo, devo deixá-la agora. O Jeffery diz que eu me apego demasiado aos nossos convidados.
— E é verdade — disse Jeffery. — Além disso, tenho de me pôr a cozinhar. As entradas, pelo menos. — E levantou a cabeça decepada de Christie.
— Nham — disse Theodore com seu sorriso sangrento. — Eu vou praticar para a sala de estar, então.
— Bebe um chá, entretanto. Eu aviso-te.
E assim, os dois homens saíram, cada um por uma porta diferente. De uma sala, vinham sons de panelas e frigideiras a serem arrastadas. Do outro, Mia começou a ouvir um violino, uma melodia inesperadamente bela.
Agora, era a vez de Mia gritar com Jessica:
— Jessica! Jessica! Acorda!
Jessica abriu lentamente os olhos.
— Rápido! Consegues mexer a cadeira?
— O quê…? Ah, acho que sim.
— Boa! Vamos deslizar as cadeiras até ficarmos de costas uma para a outra, para desatarmos as cordas! Acho que não estão muito apertadas.
— OK!
— Depressa!
Começaram a mexer-se, e as cadeiras moveram-se na direção uma da outra. Posicionaram-se para desamarrar a corda, a puxar e a esticar, fazendo o melhor que conseguiam sem a ajuda dos olhos. Felizmente, os irmãos não tinham sido minuciosos. As raparigas conseguiram libertar as mãos. Depois, os pés.
Jessica levantou-se e olhou freneticamente para as duas portas. Mia fez o mesmo, enquanto evitava olhar para os corpo de Christie e de Rhonda, ainda pendurados do teto.
De repente, a música parou.
Os olhos de Jessica pousaram no machado em cima da mesa ensanguentada. Ela correu e apanhou-o, no momento exato em que Theodore entrava na sala novamente.
— Estão a gostar da música, minhas quer-?
Theodore não terminou a frase. O machado apanhou-o de surpresa no braço, e depois na perna, e depois, ao tropeçar, nas costas. Tanto ele como Jessica estavam cobertos do sangue dele.
Ele gritou, enquanto caía, mas conseguiu tirar o machado das mãos de Jessica e, num segundo, atingiu-a no pescoço. Mia ainda estava congelada. Não acreditava no que estava a acontecer.
— THEODORE!!!
Jeffery tinha ouvido a luta e estava agora na porta oposta. Tinha um cutelo na mão.
— TU! SUA OVELHA!
Não se apercebeu de que Mia também estava solta, por estar concentrado em ajudar o irmão. Theodore estava agora encostado a uma parede, enquanto Jessica caía, com as mãos a tentarem deter o jorro de sangue.
Jeffery correu pela sala, e o movimento fez com que Mia acordasse do seu torpor. A adrenalina disparou! Agarrou num dos ganchos de metal e correu o mais rápido que podia atrás dele. Ainda estava traumatizada depois de ver as suas amigas a morrer de uma forma tão horrível, mas ela era forte; não ia morrer esta noite.
Num salto, e com toda a força, enfiou o gancho de metal no pescoço de Jeffery, mas ele virou-se e agarrou-o com ambas as mãos, olhando para Mia com os olhos cheios de ódio. Ela nunca tinha visto tanta escuridão em alguém .
Por instinto, Mia pontapeou-o no estômago e começou a correr, sem olhar para trás. A última coisa de que se lembrava era do gosto nos lábios. Com lágrimas a escorrem-lhe pelo rosto, podia sentir a vermelhidão diluída do sangue. Como se tivesse sido convidada pela morte, a beber uma chávena de chá.
SOBRE O AUTOR
Nelsenstein
Nelson, conhecido na dimensão do terror como Nelsenstein, nasceu em 2007, segundo irmão de cinco rapazes. Vive na ilha das Flores, nos Açores, e frequenta um curso profissional de cozinha. No futuro, quer ir para o Japão trabalhar. Adora dormir e tem muita dificuldade em fazer amigos, algo que, na sua mente, parece fácil, mas que é realmente difícil de pôr em prática. Adora escrever, e descobriu que escrever terror o acalma. Gosta de ver filmes e séries e adorava, um dia, ver um dos seus livros transformado numa série da Netflix.