Entrevista aos vencedores do prémio microCURTAS MOTELX 2022

«O Fantasma da Minha Infância», um filme de Carolina Aguiar, Francisco Magalhães e Pedro de Aires

Os três membros do júri destacaram, além da qualidade e da criatividade dos realizadores, a dificuldade que sentiram em escolher a melhor microCURTA de 2022. O desempate? Selecionar a narrativa concreta (há sempre abordagens ao tema mais abstratas quando o limite para contar uma história são dois minutos) que causasse mais medo. Perante estes critérios, O Fantasma da Minha Infância reuniu o consenso de KIKO (@kikoishot), Ana Correia (@peperan) e André Mariño (@demoraismarino).

Ainda me custa um bocadinho que a sala se encha apenas de amigos e familiares dos jovens artistas a concurso. Apesar de o filme vencedor ser exibido na sessão de encerramento, todos os filmes mereciam uma audiência de sala de cinema no dia em que é revelado o vencedor.

Conversei com a Carolina Aguiar, o Francisco Magalhães e o Pedro de Aires sobre o seu filme vencedor, as suas influências do terror e se podemos esperar novas curtas-metragens deles no futuro. 

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Sandra Henriques

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A vossa formação está ligada ao cinema?

Francisco Magalhães: o Pedro [de Aires] estuda dança e eu estudo cinema, estou no último ano da ESTC, e a Carolina trabalha em design de Comunicação.

Carolina Aguiar: Estou mais ligada à parte da edição e do som.

 

A ideia para o filme é baseada numa história tua, Pedro, mas quais são os vossos papéis criativos n’O Fantasma da Minha Infância?

CA: A ideia partiu da história do Pedro, mas nós desenvolvemo-la em conjunto.

PA: A ideia era só uma ideia, até a Carolina dizer que podíamos pegar nisso.

CA: Sim, estruturámos tudo a partir da história do Pedro.

FM: Estávamos os três sentados a discutir a história, não estava muito detalhado, mas sabíamos que queríamos que tivesse um final heartwarming, quase uma subversão que fosse assustadora, mas que depois mostrasse um final feliz.

CA: A ideia era criarmos uma ambiência de terror inicial e depois ter algum tipo de mensagem subliminar no final.

 

E em que momento é que decidem concorrer às microcurtas?

CA: No momento em que escrevemos a história concreta. [risos]

PA: Não foi a primeira vez que falámos sobre isto, noutros anos, e eu queria mesmo participar este ano.

 

Qual é a sensação de verem a vossa curta projetada num grande ecrã?

FM: Eu estava muito nervoso, porque já tinha visto algumas das outras curtas e achava que havia algumas que estavam mesmo muito boas, mas ao mesmo tempo, quando começou a passar, estava orgulhoso, porque nós os três somos muito amigos e criámos isto. Senti-me bem com isso.

 

E quando eles anunciaram o vencedor, qual foi a sensação?

CA: Foi um bocado surreal.

PA: Pensas que não vão dizer o teu nome e depois dizem, e é um choque durante um segundo. Principalmente porque já vimos ao MOTELX há muitos anos, e já estamos muito familiarizados com o festival. Então passarem [o nosso filme] — nem que seja na sala pequena, que isso não interessa — num grande ecrã, numa sala onde já vimos várias coisas no MOTELX, é o que me deixa mesmo feliz.

CA: O MOTELX é sempre um evento para nós.

 

Que influências é que têm no terror?

PA: O meu género favorito no terror é o slasher, que começou com o Scream. Eu já gosto de terror desde muito novo, por isso a influência é essa. O primeiro filme de terror que vi foi o Sleepy Hollow do Tim Burton. Se um dia quisesse realizar alguma coisa, que não sei se vai acontecer, seria mais algo no género do Scream do que propriamente no género da microcurta que fizemos.

FM: Para ser muito honesto, o Pedro e a Carolina é que são os fanáticos de terror. Eu gosto de terror, mas não chego a esse extremo, porque me assusto muito facilmente. Gosto muito da experiência de ir ver os filmes e de me assustar, mas não são os filmes de que eu gosto mais. Eu e o Pedro vimos muitos filmes japoneses de terror este verão, e gosto muito desse género. Mas também gosto muito do Ari Aster, por exemplo.

CA: Ia mencionar o Ari Aster também, que é um bom exemplo, mas gosto muito de tudo o que é feito no folk horror.

 

Sentem dificuldade a nível artístico em trabalhar em Portugal? Passa-vos pela cabeça tentar a vossa sorte lá fora primeiro?

CA: No meu caso, passa-me pela cabeça [ir para o estrangeiro], sim. Na minha área do design, para fazer aquilo que gostaria mesmo de fazer, em Portugal, não vai ser possível. É difícil. E no cinema, embora não seja a minha área diretamente, também.

PA: Eu não sinto tanto. Nós somos de Viseu, e eu consigo arranjar muito mais opções em Viseu do que em Lisboa. Por exemplo, comparado com a área da Carolina e do Francisco, considero que agora até estou bem. No futuro, não sei. Mas, em Viseu, tenho tido muitas oportunidades, por isso por agora ainda não estou a pensar sair.

 

Porque em Lisboa há mais concorrência ou há mais compadrio?

PA: Cá em Lisboa há muito disso, na minha área. Por exemplo, às vezes, há audições e já se sabe quem vai ficar. É por isso que digo que em Viseu tem havido mais oportunidades, até para pessoas mais novas. Eles abrem muito as portas a isso, por isso só consigo falar dessa área agora. No futuro, não sei mesmo dizer.

FM: No que diz respeito a grandes ambições, se quisesse ser um realizador incrível e ter muita fama e sucesso, se calhar, Portugal não era a opção para mim. Ainda não entrei no mercado de trabalho, mas primeiro gostava de tentar ver se consigo alguma coisa [em Portugal]. Porque é aqui que está toda a minha família, os meus amigos, é o sítio a que me sinto mais ligado. No entanto, apesar de não ter grandes ambições, às vezes, sinto que seria giro ter essas aventuras, tentar no estrangeiro. Até porque, de certa forma, no cinema, me sinto mais ligado ao que está no estrangeiro do que ao que está aqui em Portugal. Por um lado, gostava de ficar, porque me sinto ligado aqui e às pessoas que aqui estão. Acho que, tentando, se consegue sempre algum trabalho.

 

Para o ano, vamos ter uma curta-metragem vossa a concurso?

PA: Não sei.

CA: Temos de conversar. [risos] Gostava que continuássemos pelo menos a fazer alguns destes projetos pequenos.

PA: Acho que temos muitas ideias.

 

E depois há sempre as questões de orçamento, também.

PA: Sim, nós não gastámos dinheiro nenhum. Foi em casa da minha avó, foi com a minha avó, foi com um telemóvel.

 

Aquela é mesmo a tua avó?

PA: É mesmo a minha avó. E aquela é mesmo a casa da minha avó.

 

Como é que foi trabalhar com ela?

PA: Nós filmámos aquilo tudo num dia. Só estávamos nós os dois, a Carolina não estava. Mas foi bom. A minha avó já sabe os meus gostos, o único senão foi que ela não queria que aparecesse a cara.

 

Eu nem desgosto que não apareça a cara.

PA: Dá-lhe mais mistério, sim. Foi uma tarde em casa dela, onde eu cresci também, e foi baseado num jogo que nós jogávamos, eu e a minha irmã.

 

Espero que vocês continuem a fazer coisas de terror. Precisamos de mais pessoas a fazer terror português. A Fábrica do Terror tem as portas sempre abertas para divulgar novas obras e novos criadores.

PA: O nosso desafio agora era mesmo [fazer esta microcurta] para o MOTELX.

FM: Podíamos fazer alguma coisa para o ano

PA: Agora que fizemos esta, podemos ficar com o bichinho e tentar ao máximo fazer mais coisas.

CA: Eu acho que sim.

 

Qual é a vossa expectativa da reação do público na sessão de encerramento?

PA: Não é para nos gabarmos da curta, mas, pensando no que o júri disse, sinto que as pessoas vão gostar. Não estou a dizer isso por termos sido nós a fazer. Acho que é mesmo pelo tema, pelo ambiente.