MOTELX 2024: Crítica às Curtas Para Maiores de 10 Anos

Secção Sustos Curtos.

Na sessão de Sustos Curtos destinada a pré-adolescentes, Portugal marcou presença com a curta-metragem de um grupo de jovens ligados ao projeto CoolBrave. 


Marta Nazaré

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A escola foi o cenário mais escolhido entre os vários sustos. O escuro e os pesadelos mantiveram o seu protagonismo no universo do medo, mas os seres de outros planetas, mesmo que imaginários, não ficaram atrás. A comida veio definitivamente para nos assombrar, assim como as consequências do nosso estilo de vida.


Os Nossos Medos, de Bernardo Gramaxo (Portugal, 2024)

Os Nossos Medos é uma curta-metragem feita de propósito para o Lobo Mau. Produzida no âmbito do projeto CoolBrave, um grupo de jovens do Bairro da Estrada Militar, do Alto da Damaia, explora os seus maiores medos e desmistifica-os.

Atrás e à frente da câmara, ouvimo-los confessar que os maiores medos estão na vida real. Alguns envolvem animais (cães grandes, baratas, cabras, aranhas, ratos e cavalos) e outros nasceram de experiências traumáticas (como andar de avião, ir ao dentista, falar em público e, o mais famoso de todos, os famigerados testes de Matemática).

De uma forma simples e engraçada, estes jovens, que tão bem exemplificam o que vivemos atualmente, apresentaram receios que até os adultos têm: perder quem amam, sofrer bullying, ficar sem dinheiro e falhar (perante a pressão da sociedade).

A conclusão a que estes jovens chegaram, no final desta curta, é a de que os medos atrapalham, não os deixam ser quem são e limitam-nos. E que grande início dos Sustos Curtos com esta partilha. Depois desta experiência enriquecedora, de certeza que estes alunos saberão enfrentar os medos, exorcizá-los e perceber que são mais fortes do que eles.


Cole Krsuá, de David Castro González (Espanha, 2022)

No recreio de uma escola primária, várias marionetas (às quais três crianças dão voz) desabafam e barafustam para a câmara em jeito de reportagem. Estamos perante um documentário policial infantil em que se entrevistam testemunhas de um crime invulgar. Um tal de Homem Invisível parece estar no centro de tudo.

Um pouco como a curta-metragem anterior, esta animação stop-motion reúne crianças para participarem do processo de criação de uma história muito imaginativa. A sua ingenuidade e criatividade transparecem nas falas das personagens, no argumento e no próprio visual das marionetas. No fundo, tudo é brincadeira e risos num mundo visto pelos olhos das crianças.

Flesh Out, de Armin Assadipour (França, 2023)

Em Flesh Out, permanecemos em ambiente de escola. Desta vez, vamos até ao secundário, onde observamos o jovem Venance a enfrentar vários desafios devido ao excesso de peso. É vítima de bullying, a família não o entende, sente-se sozinho. Para piorar, chega a um ponto em que não consegue travar a fome. Com o tempo, esta torna-se insaciável e atinge proporções desmedidas, com as quais o próprio Venance não sabe lidar.

Esta animação foi bem-sucedida em fazer-nos empatizar com o protagonista e em mostrar-nos o conflito interior de um jovem que come desmedidamente para esconder a dor, a solidão, a incompreensão por parte de quem o rodeia. Contudo, o espectador não consegue escapar ao paralelismo com uma personagem conhecida do universo Marvel, e isso faz com que a curta-metragem perca a força na mensagem que quer transmitir.

PLSTC, de Laen Sanches (França, 2023)

O realizador Laen Sanches recorreu a Midjourney, um serviço de criação de imagens em Inteligência Artificial, para submergir o espectador numa distopia submarina perturbadora. Através de imagens de criaturas do oceano compostas à mão, esta animação experimental confronta-nos com as consequências desastrosas na vida marinha do plástico e dos hábitos dos seres humanos.

É a curta mais impactante do grupo e deixa-nos, literalmente, com falta de ar durante dois minutos.

If, de Didier Charette (Canadá, 2023)

A primeira curta-metragem do realizador Didier Charette traz-nos uma história difícil através da imaginação e da ingenuidade dos olhos de uma criança. Ryan tenta adaptar-se ao divórcio dos pais, indo ao psicólogo, sempre na companhia do seu amigo imaginário, o monstro Jo, que acaba também por contar os seus problemas na sessão. Acreditamos que o psicólogo não o deve ver e ouvir, por se tratar de um amigo imaginário, pois nunca chegam a interagir.

Juntos, Ryan e Jo enfrentam as dificuldades da vida. À medida que a criança vai superando os obstáculos, ganha emblemas, como nos escuteiros. Como nada é permanente na nossa vida, chega o dia em que Ryan e o monstro-amigo têm de embarcar numa derradeira aventura. Nessa viagem de foguetão até ao planeta IF, o menino vê-se confrontado com o seu pior medo e teme não conseguir superá-lo.

If centra-se numa realidade complicada — a forma de uma criança enfrentar o divórcio dos pais e a solidão que sente —, mas o realizador teve o cuidado de a deixar em plano de fundo. Em primeiro plano está a história doce da amizade entre um menino e o seu amigo imaginário, a superação de etapas difíceis, o ganhar confiança e o valor da amizade. 

Vida and the Chocolate Cake, de Rodrigo Elizalde & Agustín Giataganellis (Argentina, 2023)

À tarde, Vida e a mãe divertiram-se a fazer um bolo de chocolate. À noite, contudo, essas lembranças felizes transformaram-se em pesadelos, quando o bolo tenta devorar a menina. (E que gargalhadas este bolo assombrado arrancou do público!) A mãe tentou de tudo para a filha não ter medo e ficar a dormir na sua cama: fato de fantasma, máscara do Tony Stark, a combinação dos dois, mas nada resultou. Para resolver esta situação sem estar sempre a correr para a cama da mãe a meio da noite, Vida terá de tomar uma decisão que passará pelo seu querido boneco Hugo.
Vida and the Chocolate Cake polvilha os momentos mágicos e doces da infância com uma pitada de terror à Tim Burton. Mostra-nos o crescimento interior de uma criança que, de uma forma cómica e criativa, enfrenta os próprios medos.

Depois desta curta-metragem, nunca mais vamos olhar para um bolo de chocolate da mesma forma.

Dead of Night, Jack Downs & Mikel Iriarte (Reino Unido, 2024)

Dead of Night vive do jogo de sombras que todos nós experienciamos à noite, principalmente num local desconhecido.

Na sua casa nova, a jovem protagonista é acordada por algo, a meio da noite, e apercebe-se de que está uma janela aberta. Enquanto vai fechá-la, o espectador vê sombras assustadoras, olhos que brilham no escuro, a observar a jovem, mas aos quais ela parece ser alheia.

O desconhecido, aliado à escuridão, soube despertar o medo e provocar alguns pequenos sustos e arrepios no público mais novo, sem ter de recorrer a jump scares.

Mort, Giselle Bonilla (EUA, 2024)

O extraterrestre Mort levava uma vida pacífica no seu planeta, a tratar da fauna e da flora, quando é interrompido pela aterragem de emergência de uma nave espacial humana.

Embora Mort não tenha uma aparência ameaçadora nesta história de ficção científica, o astronauta fica com medo dele, teme-o por ele ser estranho e uma criatura que não conhece.

A partir daqui, a curta-metragem explorou muito bem a base de entendimento entre estes dois seres que, embora diferentes, conseguem encontrar pontos em comum. Quando não há falas, não é fácil transmitir emoções somente pela linguagem corporal, mas os atores ultrapassaram este desafio de forma exemplar.