O Primeiro Dia do 18.º MOTELX

A sessão de abertura encheu a sala Manoel de Oliveira.

Filmes censurados durante o Estado Novo, o novo Prémio Betclic Monster Shorts e o James McAvoy a cantar Eternal Flame.

Temos o hábito de chegar cedo ao Cinema São Jorge no primeiro dia do festival. Um par de horas antes da primeira sessão desta terça-feira (10 de setembro), no meio da azáfama da equipa do MOTELX, o segundo piso estava surpreendentemente calmo — não é a nossa primeira vez, por isso sabemos que isto é só o momento de respirar fundo antes de mergulhar na semana mais aguardada pelos fãs de terror em Lisboa.

A sessão de abertura trouxe-nos a novidade Prémio Betclic Monster Shorts MOTELX e o remake americano do filme dinamarquês vencedor do MOTELX 2022, Speak No Evil.

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Sessão de Abertura

Speak No Evil, de James Watkins

Em 2022, o Prémio de Melhor Longa Europeia foi atribuído a Speak no Evil, de Christian Tafdrup, na 16.ª edição do MOTELX. Dois anos mais tarde, como filme da sessão de abertura, a versão americana, cedida graciosamente em antestreia nacional pela Cinemundo, encheu a sala Manoel de Oliveira.

As expectativas eram altas, mediadas pelas premissas que sabemos guiarem o cinema de terror americano, esperando moderadas mudanças à fenomenal história original de Tafdrup. Speak No Evil (Não Fales do Mal) é um justo remake, com momentos de tensão, comédia, desconforto e uma dose satisfatória de terror psicológico. Não esquecendo de levar a boa educação ao extremo, James Watkins introduziu as modificações necessárias para tornar um excelente filme de terror dinamarquês num quase-quase equiparável filme de terror americano.


Entre nós, comentámos que James McAvoy nasceu para fazer o papel de homem louco e irascível; sem o seu sempre espantoso desempenho, e também o do restante elenco, Não Fales do Mal não teria posto uma inteira plateia a aplaudir as conquistas da astúcia feminina.


Crítica às longas-metragens

House of Sayuri, de Koji Shiraishi

Baseado no manga Sayuri, de R. Oshikiri, este filme conta a história da família Kamiki, que se muda para aquela que seria uma casa de sonho, mas que rapidamente se percebe que é de facto um pesadelo, não fosse a mesma ser habitada pelo espírito de Sayuri, que tem na vingança a sua razão de existir.

As inspirações no manga são óbvias do princípio ao fim. Seja no humor exagerado, ou na dramatização excessiva de algumas das personagens; é evidente que houve uma tentativa de respeitar a obra original e esse é, possivelmente, o elemento mais forte e mais negativo do filme. Para alguém que aprecie mangas e animes, é um filme divertido e muito interessante, mas, para quem não esteja acostumado a ver este tipo de conteúdos, o exagero poderá passar quase por ridículo, retirando seriedade e algum do fator medo que esta história poderia ter.


É um filme com uma história cativante que viaja pelos géneros do humor absurdo, drama e clássico terror japonês — e com aquela que será possivelmente a avó mais badass que já se viu num filme de terror.


Críticas às curtas-metragens

Dance with the Devil, de Tim Khvan

Um mockumentary que segue o ex-padre Marcus e o seu estagiário naquilo que é uma típica noite de trabalho da sua empresa especializada em exorcismos ao domicílio. Neste curto filme, é possível observar encontros com demónios, exorcismos, interações com empresas rivais e as típicas dificuldades que um exorcista pode encontrar na sua área de negócio. Um filme que faz do humor a sua grande arma do princípio ao fim e que facilmente poderia ser adaptado a algo muito maior. 

Cakes, de Johnny Herbin

Um  micromusical na forma de alucinação que surpreende pela execução e originalidade, com uma letra e ações que se tornam rapidamente mais negras conforme o tempo vai passando, até ao desfecho final. Com uma execução excecional, este filme peca apenas por ser tão curto.

 

Secção «A Bem da Nação» 

The Plague of the Zombies, de John Gilling

Nos 50 anos da celebração do 25 de Abril, o MOTELX decidiu selecionar uma série de filmes de terror que foram proibidos durante o Estado Novo. O escolhido para dar o arranque ao festival, The Plague of the Zombies, de John Gilling, foi proibido por aludir à magia negra, sendo de particular importância que não passasse nas zonas rurais.

Produzido em 1966, dois anos antes de Night of the Living Dead de George Romero, os zombies são caracterizados pela sua origem nas práticas do vudu, sendo os mesmos criados propositadamente para servir alguém, como escravos, em vez da típica praga que é hoje bem mais comum nos filmes do género.


É uma escolha, sem dúvida, muito interessante para começar o festival e representar o tipo de filmes que eram censurados durante a ditadura. Um filme com uma história interessante, bem construído e que, apesar da idade, que poderá incomodar aqueles que não apreciam filmes mais antigos, continua a entreter.